terça-feira, 29 de março de 2011

O DESAFIO DA INTERCULTURALIDADE NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES INDÍGENA

Historicamente a educação escolar entre os povos indígenas, no
Brasil, representou um recurso fundamental à construção de
“identidades colonizadas” (GRUZINSK, 2001), favorecendo um complexo
sistema que unia a dominação cultural com a integração forçada no
sistema produtivo nacional. Dessa forma, partimos do pressuposto de
que este modelo tradicional de escola assimilado pelas comunidades
indígenas é o de uma escola homogeneizadora e etnocentrista e que
sempre se pautou pela não inclusão das culturas diferenciadas, mas,
que na atualidade, confronta-se, por força de conquistas indígenas
legitimadas por lei, com propostas de uma nova epistemologia, a
interculturalidade.
Nas últimas décadas do século XX, por iniciativa dos povos
indígenas, com apoio de universidades e ONG’s, esta realidade colonial,
de uma escola a serviço da assimilação compulsória, vem mudando,
tendo como marco legal, a Constituição Federal de 1988, a qual garante,
além do reconhecimento da diversidade linguística e sociocultural, uma
educação indígena específica, diferenciada, bilíngue e comunitária. Dessa forma, os indígenas passam a ressignificar esta escola e a tomá-
la para si, colocando-a como espaço de fronteira (TASSINARI, 2001),
lócus de negociação entre culturas distintas (BHABHA, 1998; HALL,
2003).
Assim, ao conquistarem o direito a uma escola específica e
diferenciada, multicultural e comunitária os povos indígenas abrem um
campo de estudos no qual, movimentam-se como protagonistas, no
sentido de pensar o currículo a partir de uma outra lógica: a lógica do
diálogo entre os seus saberes e os saberes legitimados historicamente
pela cultura escolar. Mais especificamente o professor indígena, neste
novo modelo, passa a ocupar um lugar central, levando em
consideração as especificidades de cada povo, nos processos de
repensar a realidade das comunidades indígenas na convivência nem
sempre harmônica com a chamada “sociedade nacional”.
Podemos considerar que as primeiras experiências de formação
inicial e continuada de professores indígenas dentro de uma nova
concepção de escola intercultural começam a tomar corpo, no Brasil, a
partir do final da década de 1970, ainda que o processo de reflexão e
sistematização teórica tenha aparecido apenas anos mais tarde3
, a partir
da década de 1980 (FERREIRA, 2001).
Estas novas experiências, seguidas de reivindicações, encontram
acolhida no conjunto do ordenamento jurídico-legal a partir da
Constituição Federal de 1988 e, também, da nova LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação) de 1996, às quais garantem aos povos indígenas o
direito de estabelecerem formas particulares de organização escolar, e
lhes asseguram grande autonomia no que se refere à criação,
desenvolvimento e avaliação dos conteúdos a serem incorporados em
suas escolas (Cf. BRASIL/MEC/SEF, 2002).
A escola indígena começa a ser sonhada desde então, como um
espaço de apropriação dos conhecimentos da cultura oficial dominante,
necessários à sobrevivência sócio-econômica-cultural autônoma dos
povos indígenas; mas, também, como espaço de transmissão e reflexão
dos etno-conhecimentos, sempre respeitando e valorizando os espaços
tradicionais de educação; por fim, a escola indígena passa a ser vista
como lócus de diálogo intercultural, onde a cultura indígena e o saber
não índio são valorizados e aproveitados igualmente.
Esse processo representou grande significatividade para os povos
indígenas do Estado, particularmente para os Kaiowá e Guarani, os
quais, a partir deste processo pós-Constituição de 1988, conseguiram
formar uma Associação de Professores, com grande presença política
nas comunidades e nas questões de luta pela retomada dos territórios
tradicionais.


Fonte: Espaço ameríndio [1982-6524] ANTONIO Ano:2010 Vol:4 Nr:1


Texto integral disponível via internet.

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