quinta-feira, 16 de julho de 2015

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A invisibilidade antes da Lei 11.645

     
Tenho participado de muitas palestras em escolas, universidades e conferências onde  se discute educação. Em várias cidades que passei durante esse ano me deparei com profissionais preocupados e muitos despreparados (segundo eles mesmos) para se trabalhar em sala de aula as questões afro e indígena que se tornaram obrigatórias a partir da lei 11.645 de março de 2008.
  O que me deixa indignada como kaingang é ver e ouvir a imagem que as pessoas tem sobre nosso povo, seja ele de qual etnia for. Não culpo esses profissionais por não ter clareza sobre a nossa atual forma de organização,sobre como e onde estamos atualmente, afinal, vivemos num país que pouco fala sobre seu povo,sobre essa diversidade cultural, riquíssima, aliás, vivemos num país que não conhece seu povo e muito menos sabe a verdadeira história dos seus antepassados.Ví e viví momentos cômicos e tristes no decorrer do ano, passei em escolas onde alunos se decepcionavam quando me recebiam nas salas de aula por acreditarem ainda que uma indígena deveria estar coberta apenas com penas e cocar na cabeça, também vi numa certa ocasião uma criança ficar com medo e me perguntar se eu não iria “comê-la”. Fui questionada por pessoas adultas sobre a minha verdadeira identidade: Mas vocênão é índia de verdade né? E por aí vai questionamentos nessa linha. A obrigatoriedade em tratar esse “tema” me faz refletir. Me pergunto hoje onde estávamos até então? Se uso roupas e me expresso bem, como essa sociedade me via até hoje? Porque a imagem que as pessoas tinham (e tem) era de um índio, nu, no meio do mato, caçando e pescando em harmonia com a natureza. Penso que é assim que deveria ser, mas em que natureza eu estaria? Pescar oque se não temos mais rios limpos, caçar oque se não temos mais mato?
A lei 11.645 veio pra mostrar ao país que existimos sim!E ainda existiremos mesmo que sejamos obrigados a nos integrar totalmente à sociedade ocidental, somos diferentes sem deixar de ser iguais. Temos nossa língua, nossos costumes e nossa força!
 A pior constatação depois de tudo isso é descobrir que até então estávamos invisíveis dentro de nosso próprio chão. E que pra sermos vistos tivemos que nos tornar assunto “obrigatório” nos vários setores dessa sociedade. Talvez as coisas só melhorem quando se tornam leis, o importante é ter a chance de mostrar que aqui estamos.
 Não estamos “infelizmente” na mata como imaginavam. Estamos nas universidades, nas discussões políticas, no cenário nacional, estamos na luta para que todos possam ver e ouvir os povos indígenas do país estamos aqui, na internet, publicando em blogs e nos comunicando, não com sinal de fumaça, mas através das armas que foram a nós apresentadas pela tecnologia. Não seremos menos índios por isso, mas não deixaremos mais vender uma imagem romântica do que verdadeiramente somos atualmente.
 Que nossos professores tenham a chance de ensinar aos seus alunos a história atual dos indígenas de uma forma correta, sem ter de usar imagens ultrapassadas que fazem as crianças se decepcionarem ao nos encontrar, como aconteceu.
Que muitos adultos tenham o privilégio de sentar e conversar conosco para que possamos deixar de ser invisíveis aos olhos da sociedade.
 Acredito que isso é possível, mesmo que obrigatório, vale a pena tentar.
Laísa Erê Kaingang

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